O Sistema Único de Saúde (SUS) atendeu quase 50 baleados por dia no Brasil em 2022. Foram 17,1 mil internações de baleados em hospitais públicos do país. O levantamento é do Instituto Sou da Paz.
O estudo revela também que o tratamento desses feridos custou R$ 41 milhões aos cofres públicos — dinheiro suficiente para realizar 1 milhão de mamografias no Brasil.
“Em média, uma internação por arma de fogo custa três vezes mais que uma internação provocada por outros problemas de saúde”, explica Cristina Neme, coordenadora de projetos do Instituto Sou da Paz.
Os impactos da violência armada no país mostram ainda que, nos últimos 15 anos, as hospitalizações de baleados custaram R$ 886 milhões.
Nos hospitais do RJ o custo médio de um paciente baleado num hospital de alta complexidade é de R$ 2,3 mil por dia.
Os gastos variam de acordo com a gravidade do caso, a complexidade dos procedimentos e o tempo de internação.
Somente este ano, a Secretaria Estadual de Saúde já gastou mais de R$ 19,7 milhões, o que daria para realizar 4,6 milhões de hemogramas completos.
Não é exagero dizer que os hospitais públicos ficam sobrecarregados com a onda de violência.
A rotina no Alberto Torres
O Hospital Estadual Alberto Torres (HEAT), em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, é especializado no socorro a pacientes com múltiplos traumas. Depois dos acidentes de trânsito, o atendimento a baleados é um dos maiores na unidade.
O RJ2 acompanhou a rotina no hospital, onde um homem de 41 anos deu entrada atingido por cinco tiros.
Uma vítima de arma de fogo em estado grave tem mais chances de sobreviver se for atendida, no máximo, uma hora depois de ter sido baleada. No jargão médico, é a chamada “hora de ouro.”
“O problema não é só aquela região onde ela [a bala] entrou, aquele orifício. Quando ela atinge o tecido, ela cria o que a gente chama de ondas de choque, que vão se expandindo pelo tecido por onde passou, causando uma lesão muito maior do que aquele orifício de entrada. Além disso, existe a lesão térmica, porque esse projétil chega com altas temperaturas. Esse paciente, quando sobrevive, ainda tem que lidar com o risco de infecção”, explica a neurocirurgiã Bárbara Pilon.
Hospital Estadual Alberto Torres (HEAT), em São Gonçalo — Foto: Reprodução/TV Globo
O atendimento ao baleado é feito por pelo menos sete profissionais, que precisam tomar decisões rapidamente.
Depois de ser intubado, o homem passou por uma transfusão de sangue e foi levado ao centro cirúrgico, mas acabou morrendo pouco depois.
“Toda vez que a gente perde um paciente nessas condições é muito frustrante. A gente perder um jovem, um pai de família, ou alguém que está na fase produtiva”, diz Marcelo Pessoa, coordenador-médico do Centro de Trauma do HEAT.
Um outro paciente, de 21 anos, também chegou em estado grave à unidade. Ele foi atingido por um tiro de raspão na cabeça. Uma outra bala acertou uma área importante do corpo.
O jovem ficou sete dias na UTI. Ele foi liberado com a bala alojada no corpo porque a cirurgia seria muito arriscada.
Quando um tiro atinge a cabeça de uma pessoa, as chances de ela sobreviver são muito, muito pequenas, ainda mais sem sequelas.
“A gente lamentavelmente vive em regiões onde a violência esta conflagrada. Nós estamos num cenário de guerra, de guerra urbana, onde as lesões são completamente complexas. Isso causa transtornos enormes para os pacientes”, fala o médico.
Atendimento no Hospital Estadual Alberto Torres — Foto: Reprodução/TV Globo
Mais de R$ 37 milhões gastos no Rio
Nos hospitais da Prefeitura do Rio, os custos também são altos. Somente este ano, até o fim de outubro, foram gastos R$ 37,2 milhões. A quantia poderia ser usada em quase 1,7 milhão de ultrassonografias ginecológicas.
Os hospitais municipais da capital receberam 1.084 baleados neste período.
“Quando a gente olha para o Rio de Janeiro, a taxa de internação é um pouco superior do que a taxa média nacional. Nós temos uma taxa de homicídio quase 80% maior do que as internações. O que isso significa? Que grande parte das vítimas não chega aos hospitais para atendimento no Rio de Janeiro. Se chegasse, a sobrecarga seria maior e consequentemente os custos”, fala Cristina Neme.
fonte: G1 Rio de Janeiro