A Americanas registrou um prejuízo de R$ 4,61 bilhões entre janeiro e setembro de 2023, segundo balanço corporativo divulgado pela companhia nesta segunda-feira (26). Os números estavam suspensos desde o começo do ano passado, quando a empresa encontrou uma fraude bilionária em suas demonstrações financeiras.
O prejuízo da empresa foi puxado por uma queda de 45,1% em sua receita líquida nos nove primeiros meses de 2023 em relação ao mesmo período de 2022. Nos três trimestres deste primeiro ano de crise — que levou a companhia a um processo de recuperação judicial, com uma dívida estimada em R$ 50 bilhões —, a receita da empresa foi de R$ 10,293 bilhões.
A principal razão para essa baixa na receita foi a forte diminuição nas vendas realizadas pelos canais digitais da companhia: uma queda de 77,1% entre janeiro e setembro de 2023 em comparação com os mesmos meses de 2022.
Americanas teve prejuízo de R$ 12,9 bilhões em 2022, e de R$ 6,2 bilhões em 2021. Os números foram revisados após a empresa ter revelado “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões em seus balanços. Especificamente nos nove primeiros meses de 2022, o prejuízo foi de R$ 6 bilhões – ou seja, o resultado do período em 2023 mostra uma queda de 23,5% no prejuízo.
A Americanas entrou com pedido de recuperação judicial em janeiro de 2023, na 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. O plano foi aceito pelos credores da companhia apenas em 19 de dezembro, com apoio de mais de 90% dos votantes.
Canais digitais foram os mais impactados
Os canais digitais foram os que mais sofreram no ano passado, principalmente por conta da desconfiança de consumidores após as notícias sobre as fraudes financeiras e a recuperação judicial da empresa.
“No digital, onde se concentram as vendas de tickets mais altos, houve um abalo de confiança. Os clientes tinham preocupação em relação às entregas dos produtos e os sellers (vendedores) ficaram temerosos de não receber os repasses pelas vendas realizadas”, diz nota da Americanas.
O volume bruto de mercadorias (GMV, na sigla em inglês) vendido nos canais digitais foi de R$ 4,8 bilhões entre janeiro e setembro, uma fatia de apenas 30% de todo o GMV da companhia, de R$ 16,1 bilhões.
No mesmo período de 2022, o volume dos canais digitais foi de R$ 20,9 bilhões e representava 64% de todas as vendas da Americanas.
Além da insegurança e desconfiança dos consumidores com os canais digitais, a própria empresa pontua que optou por modificar suas estratégias de negócios visando maior rentabilidade.
A Americanas reduziu as vendas da categoria 1P (quando o varejista vende o seu produto para o marketplace e é a Americanas quem fica responsável por todo o processo de venda e entrega), migrando algumas categorias de produtos para a categoria 3P (quando é o varejista quem realiza os processos de venda e entrega). A estratégia, de acordo coma a companhia, prioriza as operações de maior rentabilidade e a redução de queima de caixa operacional.
“Neste contexto, no 9M23 o 3P representou 65% do total das vendas comparado com 51% no 9M22, o que acreditamos que contribuirá para a rentabilidade da Companhia”, diz a nota.
Lojas físicas mais resilientes
Já o GMV das lojas físicas se manteve mais estável entre os períodos de 2022 e 2023, com uma queda de 4,4% de um ano para o outro. Nos nove primeiros meses do ano passado, o volume de vendas pelos meios físicos foi de R$ 9,3 bilhões, contra R$ 9,7 bilhões registrados nos mesmos meses de 2022.
No entanto, as lojas físicas passaram a representar quase 58% das vendas da Americanas. Esse número era de 29% no mesmo período de 2022.
“A performance (das lojas físicas) melhorou à medida que as negociações com fornecedores evoluíram e o sortimento em loja foi sendo recomposto. Além disso, nesse período, também foi realizado trabalho de otimização do número de lojas, visando maior eficiência operacional”, diz a companhia.
Também como parte das estratégias adotadas pela empresa para melhorar sua estrutura operacional e financeira, a Americanas diz que optou por desacelerar as vendas de algumas linhas de tecnologia, além de migrar a venda de determinadas categorias para a operação 3P no digital.
A companhia destaca que, nas lojas físicas, a categoria que mais cresceu em volume de vendas foi a de bomboniere, seguida por biscoitos.
Relembre o caso
Em janeiro de 2023, a Americanas divulgou um fato relevante informando que havia identificado “inconsistências em lançamentos contábeis” nos balanços corporativos, em um valor que chegaria a R$ 20 bilhões. O então presidente da Americanas, Sergio Rial, decidiu deixar o comando da companhia e o escândalo iniciou um processo de derretimento de uma das maiores varejistas do Brasil.
Como consequência da revelação feita na noite de quarta-feira, os investidores amanheceram em polvorosa. As principais instituições financeiras colocaram as ações da Americanas sob revisão, e a B3, bolsa de valores de São Paulo, colocou os papéis ordinários (com direito a voto) da empresa em leilão.
Em poucos dias, a situação da Americanas degringolou. Depois de um derretimento das ações da Americanas na bolsa ao longo da semana e o início de disputas judiciais com credores em busca de pagamentos —, a empresa comunicou que mantém apenas R$ 800 milhões em caixa, o que torna a operação insustentável.
Sem solução para a pressão dos credores, a Americanas foi obrigada a entrar com um pedido de recuperação judicial para travar a dívida. As “inconsistências contábeis” haviam levado as dívidas da empresa para a casa dos R$ 43 bilhões, entre aproximadamente 16,3 mil credores.
A primeira versão do plano de recuperação judicial da companhia foi divulgada em março de 2023, mas o acordo só foi completamente aceito pelos credores em dezembro do mesmo ano. O plano apresentou um saldo de R$ 50,1 bilhões de créditos a serem reestruturados, uma dívida trabalhista de R$ 82,9 milhões e uma fraude de resultado de R$ 25,2 bilhões ao final de 2022.
O plano de recuperação judicial da Americanas aprovado pelos credores também prevê:
- O aporte de R$ 12 bilhões em aumento de capital da empresa por parte dos acionistas de referência da Americanas — o trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, que juntos detêm 30,12% do capital social da companhia;
- A venda de ativos como o Hortifruti Natural da Terra, a Uni.Co — empresa de franquias que detém marcas como Imaginarium e Puket — e a possibilidade de venda da AME, entre outros pontos.
FONTE: G1 GLOBO